Eu tô num dia frio em Porto Alegre, apertando teclas com uma tela brilhante no meu colo, sem entender como posso estar sozinho enquanto compartilho isso contigo, enquanto te vejo de camiseta há 1000 km de distância. Presença se faz no que não se vê, energia, sentidos extraterrenos. Aquilo que não sei dizer se faz parte desse plano material ou não às vezes sobe como jorro. Sinto um aperto na garganta - ponte espiritual ao mundo maior, conhecimento. O que sai de nós é expansão. Da gente. Do universo. Do tempo. Quantos anos se passam ao fechar os olhos e lentamente suspirar? Troca de ventos, ciclos. Todo fim é um início. Ainda busco pela superfície sem entender a profundidade em que me encontro, mas também sem saber se a superfície de fato existe. Faz tempo que se faz presente, poder ancestral. Você já imaginou quantas coisas já viu a lua?  Uivo na esperança de ouvir se alguém uiva de volta. Como reconhecer o momento de virada? Arrisco dizer que o ser pensante mora na dúvida.  Mas nada disso importa agora. Lentamente, como um planeta que cessa o movimento retrógrado, o movimento é retomado, mas dessa vez... algo mudou. Passageiros da insanidade, questionando o significado de real, subvertendo o que se disse até aqui por normal. Eu prefiro ser bichinho. 








Eu vivi pra ver a orla fechada num dia de sol por causa de uma pandemia. Por aqui o fluxo de helicópteros aumentou muito desde que tudo começou, não sei dizer a frequência mas  minha cabeça anda pesada pela quantidade de pousos que tem recebido por dia. Manter registros em papel é uma forma de pontuar locais para salvar o jogo no meio do caminho, coordenadas sensoriais - ao sul subjetividade, ao norte raiz. Na busca de um lugar seguro, sopetão de freio me puxa de volta pro meu corpo, coração dispara, percebo a minha própria fragilidade. Logo agora que a gente falava da efemeridade de vida e como é fácil morrer. Rasteira em uma fresta de árvore ao leste, senti, sigo sem saber se era miragem.  



Rascunho é fagulha 
Papel é inflamável





O senhor do tempo vem pra ensinar isso. Que tenho tempo. Que dá tempo. Que preciso aprender a andar menos apressado. Diminuir o passo mas seguir firme. 


Pedimos sinais ao universo, respostas que justifiquem ou deem força ao movimento. Resposta dentro, sinergia, retorno, mas isso não existe. É impossível retornar, mesmo quando retornamos. Todo dia olho pro mesmo prédio lá fora e mesmo assim todo dia os tons de rosa mudam. A estrutura reflete o mesmo céu, só que diferente. Ouço o som dos mesmos pássaros, mesmos carros. Mas de outra forma. Na cama acorda o mesmo corpo, mas outro. A gente está vivendo na fronteira do suspenso. Cresce no peito a vontade de sair do casulo, sinto não caber mais. A um passo da porta de saída o medo me prende uns minutos mais aqui dentro.  

Um dia toda essa dor será útil.







04/07/2020 






Tornar Visível é um projeto colaborativo de Gabz e Eloá Souto

Eloá Souto, tem 24 anos, é de Campo Grande (subúrbio do Rio de Janeiro). Uma capricorniana curiosa, movida a desafios e apaixonada pelo que faz. Produtora, gestora cultural, arte educadora e fotógrafa experimental. Especializada em produção executiva, há mais de 6 anos atua em festivais de música e cinema em centros culturais como CCBB, Cinema Maison de France, Reserva (SP), entre outros. Em produção audiovisual trabalhou em campanhas publicitárias para grandes marcas (Itaú, Vivo, Sadia) e programas de TV. Atualmente se divide entre seus projetos autorais com fotografia documental e na Direção de Produção da Sax Driver, gerenciando a carreira de artistas e produções audiovisuais de séries para TV. 
De suas produções mais recentes destacam-se o Hip Hop Machine - projeto multimídia presente nas plataformas digitais, na TV e em apresentações ao vivo, o Vamos Tocar - serie em uma homenagem a MPB a quatro anos no ar pelo Canal Bis/Multishow, e "O Som Delas" - Série documental que através das vozes de grandes cantoras da música brasileira investiga o universo feminino da canção.

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